Carta de Chefe Índio
- Filomena Santos
- 16 de mai. de 2021
- 5 min de leitura
Carta do Chefe Seattle
“O que ocorrer com a terra, recairá sobre os filhos da terra. Há
uma ligação em tudo.”

No ano de 1854, o presidente dos Estados Unidos fez a uma tribo
indígena a proposta de comprar grande parte de suas terras,
oferecendo, em contrapartida, a concessão de uma outra “reserva”.
O texto da resposta do Chefe Seatlle, tem sido considerado, através
dos tempos, um dos mais belos e profundos pronunciamentos já feitos
a respeito da defesa do meio ambiente.
Como é que se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra? Essa
ideia nos parece estranha. Se não possuímos o frescor do ar e o brilho
da água, como é possível comprá-los?
Cada pedaço desta terra é sagrado para meu povo. Cada ramo
brilhante de um pinheiro, cada punhado de areia das praias, a
penumbra na floresta densa, cada clareira e insecto a zumbir são
sagrados na memória e experiência de meu povo. A seiva que percorre
o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem
vermelho.
Os mortos do homem branco esquecem sua terra de origem quando
vão caminhar entre as estrelas. Nossos mortos jamais esquecem esta
bela terra, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra
e ela faz parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo,
o cavalo, a grande águia, são nossos irmãos. Os picos rochosos, os sulcos húmidos nas campinas, o calor do corpo do potro, e o homem – todos pertencem à mesma família.
Portanto, quando o Grande Chefe em Washington manda dizer que
deseja comprar nossa terra, pede muito de nós.
O Grande Chefe diz que nos reservará um lugar onde possamos viver
satisfeitos. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Portanto, nós
vamos considerar sua oferta de comprar nossa terra. Mas isso não será
fácil. Esta terra é sagrada para nós.
Essa água brilhante que escorre nos riachos e rios não é apenas água,
mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra,
vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada, e devem ensinar as
suas crianças que ela é sagrada e que cada reflexo nas águas límpidas
dos lagos fala de acontecimentos e lembranças da vida do meu povo.
O murmúrio das águas é a voz de meus ancestrais.
Os rios são nossos irmãos, saciam nossa sede. Os rios carregam nossas
canoas e alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos nossa terra,
vocês devem lembrar e ensinar a seus filhos que os rios são nossos
irmãos e seus também. E, portanto, vocês devem dar aos rios a
bondade que dedicariam a qualquer irmão.
Sabemos que o homem branco não compreende nossos costumes.
Uma porção da terra, para ele, tem o mesmo significado que qualquer
outra, pois é um forasteiro que vem à noite e extrai da terra aquilo de
que necessita. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, e quando ele
a conquista, prossegue seu caminho. Deixa para trás os túmulos de
seus antepassados e não se incomoda. Rapta da terra aquilo que seria
de seus filhos e não se importa. A sepultura de seu pai e os direitos de
seus filhos são esquecidos. Trata sua mãe, a terra, e seu irmão, o céu,
como coisas que possam ser compradas, saqueadas, vendidas como
carneiros ou enfeites coloridos. Seu apetite devorará a terra, deixando
somente um deserto.
Eu não sei, nossos costumes são diferentes dos seus. A visão de suas
cidades fere os olhos do homem vermelho. Talvez seja porque o
homem vermelho é um selvagem e não compreenda.
Não há um lugar quieto nas cidades do homem branco. Nenhum lugar
onde se possa ouvir o desabrochar de folhas na primavera ou o bater
das asas de um insecto. Mas talvez seja porque eu sou um selvagem e
não compreendo. O ruído parece somente insultar os ouvidos. E o que resta da vida se um homem não pode ouvir o choro solitário de uma ave ou o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, à noite? Eu sou um homem vermelho e não compreendo. O índio prefere o suave murmúrio do vento encrespando a face do lago, e o próprio vento, limpo por uma chuva diurna ou perfumado pelos pinheiros.
O ar é precioso para o homem vermelho, pois todas as coisas compartilham o mesmo sopro – o animal, a árvore, o homem, todos compartilham o mesmo sopro. Parece que o homem branco não sente o ar que respira. Como um homem agonizante há vários dias, é insensível ao mau cheiro. Mas se vendermos nossa terra ao homem branco, ele deve lembrar que o ar é precioso para nós, que o ar
compartilha seu espírito com toda a vida que mantém. O vento que deu a nosso avô seu primeiro inspirar também recebe seu último suspiro. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem mantê-la intacta e sagrada, como um lugar onde até mesmo o homem branco possa ir saborear o vento açucarado pelas flores dos prados.
Portanto, vamos meditar sobre sua oferta de comprar nossa terra. Se decidirmos aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais desta terra como seus irmãos.
Sou um selvagem e não compreendo qualquer outra forma de agir.
Vi um milhar de búfalos apodrecendo na planície, abandonados pelo
homem branco que os alvejou de um trem ao passar. Eu sou um selvagem e não compreendo como é que o fumegante cavalo de ferro pode ser mais importante que o búfalo, que sacrificamos somente para permanecer vivos.
O que é o homem sem os animais? Se todos os animais se fossem o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, breve acontece com o homem. Há uma ligação em tudo.
Vocês devem ensinar às suas crianças que o solo a seus pés é a cinza de nossos avós. Para que respeitem a terra, digam a seus filhos que ela foi enriquecida com as vidas de nosso povo. Ensinem as suas crianças o que ensinamos as nossas que a terra é nossa mãe. Tudo o que acontecer à terra, acontecerá aos filhos da terra.
Se os homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos.
Isto sabemos: a terra não pertence ao homem; o homem pertence à terra. Isto sabemos: todas as coisas estão ligadas como o sangue que une uma família. Há uma ligação em tudo. O que ocorrer com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não tramou o tecido da vida; ele é simplesmente um de seus fios. Tudo
o que fizer ao tecido, fará a si mesmo.
Mesmo o homem branco, cujo Deus caminha e fala com ele de amigo para amigo, não pode estar isento do destino comum. É possível que sejamos irmãos, apesar de tudo. Veremos. De uma coisa estamos certos – e o homem branco poderá vir a descobrir um dia: nosso Deus é o mesmo Deus. Vocês podem pensar que O possuem, como desejam possuir nossa terra; mas não é possível. Ele é o Deus do homem, e Sua compaixão é igual para o homem vermelho e para o homem branco. A terra lhe é preciosa, e ferí-la é desprezar seu criador. Os
brancos também passarão; talvez mais cedo que todas as outras tribos.
Contaminem suas camas, e uma noite serão sufocados pelos
próprios dejetos.
Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão intensamente, iluminados pela força do Deus que os trouxe a esta terra e por alguma razão especial lhes deu o domínio sobre a terra e sobre o homem vermelho. Esse destino é um mistério para nós, pois não compreendemos que todos os búfalos sejam exterminados, os cavalos bravios sejam todos domados, os recantos secretos da floresta densa
impregnadas do cheiro de muitos homens, e a visão dos morros obstruída por fios que falam.
Onde está o arvoredo? Desapareceu.
Onde está a águia? Desapareceu.
É o final da vida e o início da sobrevivência.
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